sexta-feira, 25 de junho de 2010

Compreendendo Gramsci.



Compreendendo Antônio Gramsci (1891-1937)

Surge então uma nova leitura das obras de Karl Marx, só que agora com um novo foco, para uma nova época, séc. XX. É Antonio Gramsci que se propõe a fazer novas interpretações e até sugestões para as obras marxianas.
Como bem conhecemos Marx, podemos resumidamente expor algumas de suas ideias centrais: materialismo histórico, evolucionismo, luta de classes, relações sociais de produção, exploração burguesa e o comunismo.
Para Marx, a história da humanidade resumia-se apenas nas lutas de classes (burguesia x proletariado). A burguesia, vista como a classe dominante, detentora da ideologia dominante e também de todos os meios de produção capitalista exercia o poder maior, estadista, onde toda essa ideologia era aplicada.
O estado, segundo Marx, era um instrumento de dominação da burguesia para com o trabalho proletário. Era por meio do Estado que toda exploração gerada por esse modo de produção capitalista era legitimada e defendida, e que por meio de uma ideologia era aceita pelo proletário como algo que fosse natural ao sistema.
Essa ideologia era vista por Marx como uma falsa consciência, que fazia com que a realidade verdadeira – da exploração burguesa, exploração do trabalho- ganhasse aspectos distorcidos, encobertos pela “mentira” burguesa. Para Marx, o proletário não possuía uma ideologia. Apenas uma ideologia existia, a da classe dominante, que criava uma falsa consciência nos explorados. A ideologia era produto das relações sociais de produção e não de uma atividade “espiritual” do ser (intelectual), ou melhor: a infraestrutura (relações sociais de produção) era base de toda ideologia, ou seja, de toda superestrutura.
Como o proletário não possuía uma ideologia própria e não fazia parte e muito menos tinha voz no Estado, cabe aqui perguntar como deveriam agir para derrubar essas condições sociais, modificar a realidade.
Para Marx, a mudança dessa realidade só poderia ser dada por um único caminho, uma revolução. Tal revolução deveria extinguir com todas as relações sociais de produção vigentes, com o Estado (já que este era o instrumento de dominação da burguesia) e com as classes sociais. Só assim a realidade iria mudar, alcançando um novo estado, o qual Marx categorizava por “comunismo”.
Com essa breve introdução a Marx podemos agora falar sobre Antonio Gramsci, um marxista do século XX que nos trás novos pontos de vista sobre uma nova realidade e sobre os escritos marxianos.
Com Gramsci, a teoria marxiana ganha uma nova dimensão: a superestrutura passa a ter importância antes mesmo da infraestrutura, o “proletário” possui ideologia, as relações sociais de produção perdem o espaço para a sociedade civil e a questão nacional passa a ser pensada, já que para Marx só importava as disputas entre as classes sociais.
Podemos pensar o que levou Gramsci a fazer novas interpretações de Marx: será que essa nova visão veio devido as mudanças sociais que ocorreram entre o período de Marx e o de Gramsci, ou seja, Marx pensava de uma forma pois vivia em um período diferente de Gramsci em que as coisas já haviam alcançado um estágio mais complexo ( na época de Gramsci o sufrágio universal já havia sido conquistado, existiam grandes partidos de massa, sindicatos)¿ Pode ser uma explicação para tais interpretações, mas não nos deteremos apenas nisso.
Esse novo olhar, proposto por Gramsci propunha que o marxismo deveria ser repensado sobre essa nova realidade política.
É nessa nova realidade política que encontramos o Estado não mais externo a sociedade, como Marx defendia ser em sua época. Agora, o Estado estava em relação direta com a sociedade civil. A dualidade Estado e sociedade civil chega ao fim.
Sobre a sociedade civil, que representa uma esfera da vida social, é para Gramsci um conjunto de organismos vulgarmente ditos privados que correspondem a função de “hegemonia a que o grupo dominante exerce na sociedade” (igreja, escola, etc.). É na sociedade civil onde os lances decisivos ocorrem, onde se tomam as principais decisões. Marx via a sociedade civil como apenas um mundo privado da economia, sob domínio da classe dominante, e que é no Estado que as principais decisões são tomadas.
A sociedade civil adquire principalmente três aspectos em Gramsci, são eles:
1. “como ideologia da classe dominante, ela abrange todos os ramos da ideologia: artes, ciência, direito, etc.” O que pensar sobre isso? Devemos pensar que Gramsci ainda mantém uma postura parecida com a de Marx. Para Gramsci a ideologia dominante abrange todas as instituições da sociedade civil que estão sob o domínio do estado. Quando alguém quer disputar o poder, deve lutar dentro dessas instituições, dessas ideologias: mudar a arte, direito, ciência, etc. Ao contrário do que Marx afirmava, que para que o proletário alcançasse o poder deveria extinguir o Estado entre outras coisas.
2.”Como concepção de mundo, a sociedade civil deve se adaptar a todos os grupos, pois ela possui diferentes grupos qualitativos: filosofia, religião, folclore.” Gramsci defende aqui que é na sociedade civil que as concepções de mundo devem ser criadas e universalizadas dentro da sociedade. Segundo Gramsci, ideologia é uma concepção de mundo.
3.” Como direção ideológica da sociedade; material ideológico: escolas, mídias, bibliotecas.” São por esses meios entre muitos outros que a ideologia é transmitida para as pessoas da sociedade.
É notável essa ênfase que Gramsci da a sociedade civil, já que ela é um espaço de reivindicações tanto de burgueses e proletários em seus conflitos de ideologias. É nesse ponto que podemos encontrar uma contraposição a Marx: Ao contrário de Marx, Gramsci defende que as ideologias (tanto burguesa e proletária) entram em conflito na sociedade civil para defender interesses. Podemos definir aqui que Gramsci, opostamente a Marx, afirma que a ideologia dominante esta presente e é gerada na sociedade civil, e não nas relações sociais de produção.
Não é apenas com a sociedade civil que Gramsci trabalha, mas como falamos acima, a figura do Estado remete a sociedade política.
O Estado, em Gramsci, corresponde à função de dominação direta ou de comando que se exprime no governo jurídico, por meio das leis. O governo político é o aparelho de coerção que assegura a lealdade e a disciplina dos grupos que recusam as regras de agir. Mas isso não quer dizer que o Estado é superior à sociedade civil. É quando falha o consenso nas regras do agir que o Governo político atua, ou seja, quando há crise na sociedade civil.
Logo que falamos em Estado devemos nos voltar para os aspectos de uma sociedade política em que uma superestrutura atua como forma de coerção entre outros aspectos. Devemos saber, também, que, segundo Gramsci, a sociedade política é um prolongamento da sociedade civil.
Um conceito que Gramsci que está diretamente ligado à sociedade política é o de hegemonia. A hegemonia é uma forma de consentimento em que uma liderança moral é estabelecida (não só moral como espiritual e política) na vida social. É como definir uma visão de mundo. O consentimento ocorre quando o poder é internalizado pela sociedade civil. Então, podemos concluir que para que uma sociedade política mantenha o poder, não só uma sociedade, mas partidos, sindicatos, grupos políticos, é preciso que se alcance a hegemonia de sua política, que a sociedade civil ou qualquer outra instituição, órgão internalize sua ideologia.
Para deixarmos mais claro esse aspecto de hegemonia, podemos citar exemplos históricos que de certa forma comprovam que para um grupo, uma sociedade política para se manter no poder é preciso alcançar um consenso político, moral e espiritual junto com a sociedade civil. A ditadura militar no Brasil é um exemplo a ser citado, pois mostra que uma hegemonia não foi alcançada e com isso sua estrutura política não conseguiu se sustentar, enquanto a sociedade civil se mostrava uma organizada e disposta a derrubar a ditadura, não internalizando a ideologia militar. Outro exemplo é do socialismo de Lenin na URSS, em que o poder foi conquistado pela força, mas que não alcançou o consenso da sociedade civil. Vemos então que é possível conquistar o poder pela força, mas segundo Gramsci sem uma hegemonia da ideologia não é possível manter o poder.
Podemos concluir então fazendo uma última comparação entre Marx e Gramsci: O “marxismo” de Marx só estava em voga em momentos de revolução, conflito entre classes enquanto Gramsci pensa o marxismo em qualquer momento e em várias esferas (“aparelhos ideológicos de Estado”) não só nas lutas de classe e nas relações sociais de produção. Podemos dizer, também, que o foco de Gramsci não é o Estado. Para ele não é apenas com a conquista de poder se resolve os problemas, mas sim pela sociedade civil e suas instituições que mudanças serão alcançadas.


Matheus G. M. Ferreira
Ciências Sociais, UFJF.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

A falta que fará José Saramago.


Sexta-feira, 18 de junho. Uma noticia nos pega de surpresa (pelo menos aos adoradores e leitores das obras de José Saramago): morre o escritor José Saramago. Minha atenção aqui esta voltada as discuções travadas pelo escritor questionando a realidade social, economica e politica do mundo em que vivemos. Para ficar mais claro, desejo utilizar algumas palavras, pensamentos de José Saramago para refletir sobre um fenomeno que vem movimentando os estudantes da Universidade Federal de Juiz de Fora: o aumento das passagens do transporte público em Juiz de Fora.
O municipio de Juiz de Fora não é tão grande comparado com a capital BH, ocupada apenas por cerca de 400 mil habitantes. A universidade federal atrai muitas pessoas de outros municipios, sejam cidades do mesmo estado ou de outros (RJ, BH, SP, etc). Esses estudantes participam ativamente da economia da cidade. Sobre Juiz de Fora ja é o bastante para nos auxiliar na reflexão.
Focamos agora o que envolve o aumento da passagem. Nessa quarta-feira, foi feita uma manifestação na porta do local onde seria discutido o aumento das passagens. Tal manifestação foi organizada na universidade pelo Diretório Central Estudantil. Mas será que eles realmente fizeram diferença na discussão? Será que eles conseguiram romper com a barreira da hegemonia do capital, na sede de lucrar cada ves mais? Acredito que não. A passagem irá aumentar. Se essa é uma vontade da sociedade civil representada pelo DCE e os estudantes por que não atende-los, já que vivemos em uma "democracia", e todos tem direitos de participação assegurados pelo estado. Porém, maldito porém, se há um lugar que a democracia não pode se manifestar é na economia. E isso pode ser claramente visivel se fizermos um pouco de reflexão. Quem é que escolhe o presidente do Banco Central, a sociedade? Não né. Somos nós que escolhemos o presidente das OMC's? Claro que não né. Nosso incrivel José Saramago nos chamava atenção para este tipo de situação. Não vivemos em uma democracia, pois não discutimos sobre a realidade social, a realidade politica, a realidade economica. (ver video: http://www.youtube.com/watch?v=BUU4JmuvXKQ ).
Quando isso irá mudar? Como isso pode mudar? Cabe a nós achar esse caminho, e antes de achar, acreditar que ele existe, pois parece que a sociedade civil brasileira não se encontra como uma sociedade civil, não colocamos interesses gerais em voga, nos preocupamos apenas nos interesses próprios. O monstro da apatia politica esta a solta e precisa ser derrubado. Tudo depende de nós.

Matheus Gomes Mendonça Ferreira
Ciências Sociais - UFJF